O Monumento-Mausoléu aos Heróis de 1932

 

Texto de Maria Adelaide de Paula Souza

 

Em 1933 reuniu-se por iniciativa da "Sociedade Cívica de Veteranos de 32", um grupo de ilustres paulistas para estudar a forma de se levantar um "MONUMENTO-MAUSOLÉU" aos heróis tombados em 1932.

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O então vereador Paulo Vieira, também veterano da Revolução, havia conseguido da Câmara Municipal a aprovação de uma verba de 20 mil cruzeiros para a edificação de um monumento à memória de Miragaia, Martins, Drausio e Camargo, os primeiros jovens tombados em 1932 (23 de Maio na praça da República).

 

Essa construção não se efetivou, pois, Paulo Vieira procurado por elementos da Sociedade Cívica de Veteranos - M.M.D.C., concordou em transferir a verba para o "MONUMENTO MAUSOLÉU AOS HERÓIS DE 32". A intenção foi plenamente justificada, pois repousariam também no "MAUSOLÉU" os restos mortais de Miragaia, Martins, Drausio e Camargo e do caboclo Paulo Virgínio, mártir de Cunha.

 

Inúmeras foram as dificuldades encontradas pela comissão, composta, entre outros, por: Benedito Montenegro, presidente, Herbert Victor Levy, Alberto Aguiar Wisson, Horácio de Mello - tesoureiros; António Carlos Pacheco e Silva, António Fonseca Telles, Henrique Bayma, Waldemar Martins Ferreira e José Benedito Machado Florence - secretários e conselheiros.

 

A primeira iniciativa da comissão foi a abertura de um concurso, baseado em condições formuladas por um grupo de arquitetos, engenheiros e artistas plásticos que julgariam os trabalhos apresentados. Concomitantemente, com a abertura do concurso foi também iniciada uma subscrição pública para a construção do "MAUSOLÉU".

 

Dos 17 artistas concorrentes com projetos, cujo prémio seria a edificação do "MAUSOLÉU de 32", tirou o 1o. lugar Galileo Emendabili.

 

Nesse mesmo ano (1934) o Governo do Estado contribuiu com 500 mil cruzeiros, verba incluída nas Disposições Transitórias da Constituição do Estado, de 1935. Tais foram os impecilhos surgidos dali para a frente, que a comissão encarregada de promover e superintender a construção se viu obrigada a en­cerrar suas atividades. Os fundos obtidos foram depositados em Banco.

 

Em 1946 a Assembleia Legislativa votava verba de 2 milhões de cruzeiros que, somada às doações populares, perfez a quantia de 9 milhões; entretanto, a elevação do custo de material e mão-de-obra tornou impossível a construção.

 

Em 1947 o Prefeito Cristiano Stockler das Neves delimitava definitivamente, com a comissão do "MAUSOLÉU", uma área no Ibirapuera, para construção do mesmo.

 

No período governamental de Lucas Nogueira Garcez (1951-1955) apelou à Comissão uma vez mais por um auxílio à construção. O Governador enviou imediatamente uma mensagem à Assembleia Legislativa, que prontamente atendeu, abrindo um crédito especial de 15 milhões.

 

Já iam adiantados os trabalhos no Parque Ibirapuera que, juntamente com o "Monumento ao Soldado Constitucionalista" do escultor Galileo Emendabili, seriam inaugurados nas comemorações do IV Centenário da Cidade de São Paulo, em 1954.

 

As paralisações frequentes atrasaram novamente a construção do "MAUSOLÉU", que só retomou seu ritmo quando o Governador Ademar de Barros destinou uma verba de 70 milhões de cruzeiros, para completar o monumento.

 

Não foi possível inaugurar o "MAUSOLÉU" em 1954, mas antecedendo o traslado dos restos mortais dos herpis da Revolução Constitucionalista de 1932, Miragaia, Martins, Drausio, Camargo e Paulo Virginio, tomaram posse do chão que lhes fora reservado. Foram trasladados a 9 de Julho desse ano.

Foi uma auspiciosa coincidência, pois na verdade 9 de Julho começou a 23 de Maio, na Praça da Repú­blica e seus heróis mereciam realmente chegar an­tes daqueles que posteriormente tombaram.

 

Galileo Emendabili, que viveu e sentiu a "Revolução Constitucionalista", conseguiu idealizar numa felicíssima unidade arquitetônica-escultural, toda a epopéia que foi o movimento heróico de São Paulo, pela Constituição Brasileira. Desde que a motivação da Revolução de "32" foi a reconquista da Lei para o Brasil, tratava-se de uma "Guerra Santa", a luta por um ideal.

 

Emendabili compreendeu esse Ideal maravilhosamente e o realizou: fixou na Cripta toda a mística e no Obelisco toda a ação do Movimento Constitu­cionalista.

 

Antes de descermos os degraus que, do nível da rua nos levarão à entrada do "MAUSOLÉU", leiamos contritos e com respeito as palavras de José Benedito Machado Florence, sobre as portas da Cripta:

"VIVERAM POUCO PARA MORRER BEM, MORRERAM JOVENS PARA VIVER SEMPRE!

 

O Mausoléu compreende uma Cripta com 110 metros de frente, 81 metros de fundo e 5 metros de altura. A arquitetura monástica da Cripta, roçando pela rica pobreza franciscana, toda em arcos nus, é de uma imensa força sugestiva.

 

Ao centro, centro de uma cruz, sobre um túmulo está a imagem jacente do "HERÓI DE 32". Morto mas sorridente e através das pálpebras cerradas, olha para a Eternidade. Essa Eternidade é simbolizada pelo vazio, alto de 40 metros, que o Obelisco arma, em forma de uma ogiva, qual uma redoma envolvendo o "Soldado Paulista". Ali Miragaia, Martins, Drausio, Camargo e Paulo Virginio repousam seu sono eterno.

 

Os 14 columbários dispostos ao longo do corpo e braços da cruz, lembram a "Via-Crucis" e guardam os restos mortais de grande número de nossos heróis.

 

No fundo da Cripta está um altar construído para a celebração da Santa Missa.

 

A Cripta tem 1.400 metros quadrados livres, comportando 3.000 pessoas em pé.

 

Quatro são os grandes painéis de mosaico, executados em Veneza, pelo Studio Padoan, seguindo o desenho de Emendabili.

 

Painel l : São Paulo Cidade do Trabalho

 

"É este painel uma faixa circular, início da alta abóbada cónica, aberta no interior do imenso Obelisco e emborcada como redoma, sobre o sono eterno do "GRANDE HERÓI", estendido na sua Essa, entre a Cripta e a Capela. As imagens desse anel de mosaico dir-se-iam a derradeira visão de São Paulo que o Herói guardasse sob as pálpebras fechadas.

 

Entre o voo da "Bandeira das treze listas" e a bênção do Apóstolo São Paulo, opostas diametralmente no aro enorme, desdobra-se toda uma teoria de másculas figuras do trabalho: o timoneiro ao leme (evocação do "Non ducor, duco", do brasão metropolitano); abridores de estradas e assentadores de dormentes, pedreiros construtores, operários da Indústria, da Lavoura, do Comércio. Acompanhando essas imagens reza a legenda circular ininterrupta:

"Gente do trabalho muito múltiplo, como seu pa­droeiro - o apóstolo São Paulo - levou ao gentio o livro e teve a espada do martírio" (Guilherme de Almeida).

 

Embaixo, na Capela, os três grandes murais; à esquerda, ao fundo e à direita do altar, três máximos instantes da vida de Jesus Cristo sobre a terra, paralelos a três momentos máximos da História de São Paulo. Essa simbólica correspondência entre o plano divino e o humano tratada com religioso respeito, assim se apresenta.

 

Painel II: Natividade (esquerda do altar)

 

"O menino Jesus entre Maria e José e a piedosa adoração e humilde oferenda dos pastores; simultaneamente, ao alto, surge a Fundação do Colégio Jesuítico, obra paciente da catequese e da defesa do burgo nascente: Anchieta, Nobrega, Caiuby, Tibiriçá.

 

Painel III : CALVÁRIO (ao fundo)

 

"O Deus Mártir, braços abertos para a Humanidade e Maria, de joelhos, ante o Filho crucificado. Acima, à esquerda, a Mãe Paulista despede-se do filho que confiante parte para a trincheira. À direita tomba em combate o Voluntário de 32......

 

Painel IV - RESURREIÇÃO (direita)

 

A pedra afastada, o túmulo aberto, os guardas adormecidos na madrugada da Resurreição, e o Senhor alçando-se em toda sua divina Glória. Simétri­cas, erguidas para o céu, de um e do outro lado, duas figuras alegóricas anunciando o advento da "VITÓRIA DA CONSTITUIÇÃO" (Guilherme de Almeida).

 

 

 

O obelisco nos seus 72 metros de altura vertical e retilínea, sugere o ímpeto característico da gente paulista. Prisma de 4 faces, lembra os 4 séculos da História de São Paulo. GaliIeo Emendabili destacou ainda 2 capítulos importantes da história da Revolução: "A Campanha do Ouro" e a invulgar mobilização da capacidade inventiva e construtiva do paulista. Ambas estão magistralmente esculpidas em bronze, nas duas portas, uma ao norte outra ao sul, que representam as duas portas de madeira dos catecúmenos defendidos por Tibiriçá e Caiubi.

 

As faces externas do Obelisco recapitulam em 16 alto-relevos (5 metros de altura por 0,70 cm de sa­liência) toda a ação gloriosa dos soldados da Lei, originários de uma raça de gigantes que desbravou, conquistou, povoou e construiu nossa terra. Em síntese o Obelisco representa Fé, Esperança e Doação do povo paulista e a invulgar coragem da "heróica juventude de 32".

 

A representação que deu Emendabili aos vultos colossais que esculpiu, define rigorosamente a atitude dos que não souberam transigir, perdoar, esquecer.

 

Todo o revestimento do "MONUMENTO-MAUSOLÉU AO SOLDADO CONSTITUCIONALISTA" é feita em "mármore travertino romano (amarelo rosado) e o piso em botticino fiorentino".

 

Ao sairmos de nossa visita ao "MONUMENTO-MAUSOLÉU AOS HERÓIS DE 32", lembremos e guar­demos em nossos corações que eles

"VIVERAM POUCO PARA MORRER BEM, MORRERAM JOVENS PARA VIVER SEMPRE".

 

O festejado poeta de 32, Guilherme de Almeida escreveu para serem inscritas no Obelisco, ao lado dos vultos representativos dos episódios da Revolução, estas palavras:

"AOS ÉPICOS DE JULHO DE 32, QUE, FIÉIS CUMPRIDORES DE SAGRADA PROMESSA FEITA A SEUS MAIORES OS QUE HOUVERAM AS TERRAS E AS GENTES POR SUA FORÇA E FÉ, NA LEI PUSERAM SUA FORÇA, E, EM SÃO PAULO, SUA FÉ".

(croquis Obelisco Ibirapuera - Galileo Emendabili)